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AS CORES DOS AUTORES 25 ABRIL "HELENA PATO|A NOITE MAIS LONGA DE TODAS AS NOITES"

Escrito por em Abril 24, 2020

AS CORES DOS AUTORES.

Na tela da Rádio, Histórias, Conversas, Confidencias, Sensibilidades. Esculpindo Memórias.

Produz e Realiza JORGE GASPAR.

14.30/16.30H

Na emissão de hoje, a presença de HELENA PATO. E o mote da conversa é o seu livro “A Noite Mais Longa de Todas as Noites”.

Escreve Maria Teresa Horta, no seu prefácio: “Uma escrita luminosa”. 

«Obra de uma precisão exemplar e simultaneamente de uma beleza límpida no seu veio narrativo, enquanto tessitura de recordações assumidamente pessoais embora arreigadamente políticas (…).

A Noite Mais Longa de Todas as Noites é pois uma obra tecida com o fio do júbilo dos ideais, mas igualmente com os acontecimentos vividos no nosso país, então asfixiado por uma longa, cruel e impiedosa ditadura. Sendo tudo isto elaborado com uma vivacidade e uma argúcia que nos leva a lê-la até chegar ao fim, para logo desejar tornar ao seu começo».

[MARIA TERESA HORTA]

«Nunca vi as comemorações do 1.º de Maio no Rossio de Lisboa, em tempo de clandestinidade, tão intensamente descritas (e vividas) como no relato de Helena sobre esse dia de 1962». [LUÍS FARINHA]

«As estórias que Helena Pato vai contando valem, primeiro, pela valência pessoal de sabor autobiográfico, de grande despojamento, sobriedade e elegância, mesmo se tal não é o principal propósito, e, depois, por serem o retrato de uma época de ‘resistência contra a ditadura’».

[JORGE SAMPAIO] 

Índice A NOITE MAIS LONGA DE TODAS AS NOITES

1. Medos2. Da aldeia para Lisboa3. Uma infância no Pós-guerra4. Erva das valetas, minha senhora5. Um vestido sem mangas no liceu?6. O Decreto-Lei e a pancadaria nas escadinhas7. A Biblioteca Cosmos e a rádio clandestina8. Os combates no fim da adolescência: da Politécnica a Campo de Ourique9. A-ssa-ssi-nos! A-ssa-ssi-nos!10. Dia do Estudante: um, dois, três, e lá ia ele outra vez…11. A Fuga12. Flausina em tempo de resistência13. Alfinetadas14. Um réveillon triste15. As Simones16. De cerzideira a auxiliar de limpezas pesadas17. Exílio no feminino18. Missiva no tempo das cerejas19. Mudanças na Primavera20. Coimbra cheirava a flores21. Exílio no Quartier Latin22. História de uma viagem rumo ao socialismo23. Primeiro de Maio, dia de muguet24. O sofrimento não tinha fim e a guerra colonial também não25. Condenado à morte no prazo concedido pela PIDE26. Conta comigo!27. Jogo de futebol no Pinhal de Leiria28. A minha prisão e a náusea29. Solidão: arma tão poderosa como a tortura30. Erro meu, má fortuna31. Mães em tempo de ditadura32. Cinco segundos33. Um pai natal34. Uma pêra e tudo sem sentido35. A blusa das flores36. Dias alegres aqueles37. Um bife na Brasileira do Chiado38. Acordar em casa39. Vozes embrulhadas em silêncio40. Um amor, dois filhos, uma vida41. O cabelo branco do amigo clandestino42. Traficando dólares43. A menina que veio do frio44. Marcelo deixa cair a máscara45. As férias, a PIDE e a GNR46. Encontros clandestinos num portão do Jardim da Estrela47. Um situacionista com carácter48. Os garotos que roubavam fruta na mercearia do bairro49. Ricas vizinhas50. Roubo de um carro às forças policiais51. A prisão de José Tengarrinha52. Dois tiros na noite e as nossas horas de aflição53. É pide, é pide, é pide!54. Os professores na alvorada da Revolução55. Confissões, traições e favores56. Ana, uma negrinha doce que tapava o riso57. No teu voto a força do Povo58. Canção das Pombas Adormecidas59. Um Memorial60. Valeu a pena, sim Uma memórias despojadas mas empolgantes de Luís Farinha. (Posfácio)Encontros com a História de Jorge Sampaio. (Posfácio) 

O dia 25 não foi o dia mais feliz da minha vida

No dia 18 Abril, ao alvorecer, tal como era prática deles, tocaram-nos à porta – e, exactamente à mesma hora, à porta de mais uma dúzia de antifascistas, em Lisboa. O Zé só teve tempo de correr para o quarto das crianças e de esconder a agenda no porta-bebés da Rosa. Quase em simultâneo, o telefone começou a tocar ininterruptamente: eram jornalistas e familiares dos amigos que também haviam sido presos, querendo avisar-nos da vaga de prisões. A notícia estava a chegar aos jornais. Nem tivemos tempo de atender. Para nós era tarde: tinham entrado pela casa dentro três agentes da PIDE/DGS e um inspector. Este, logo à entrada, informou o JT de que ia ser «detido para averiguações» – a fórmula do costume. Mandaram-no arranjar-se com brevidade e, enquanto um deles se colou à porta entreaberta da casa de banho, os outros dois passaram a pente fino os quartos, a sala, a cozinha, tudo. Procuravam algo que o incriminasse. Em vão, que a operação de limpeza, feita na véspera, não deixara rasto das actividades que desenvolvíamos. «Para fazer uma busca a sério aqui nem uma semana» – dizia, desalentado, o agente Coelho. Tinha razão o funcionário da DGS: não tanto pelos livros das nossas estantes, mais pelos montes de papéis, jornais, documentos, que atafulhavam a sala de trabalho do historiador. O telefone não se calava. Nem eu nem o Zé tivemos dúvidas do que estaria a acontecer pela cidade. «Ninguém responda! Bem sabemos que há muita gente a querer falar consigo» – avisou um deles, um tal Bronze, enquanto folheava manuscritos, numa leitura minuciosa dos trabalhos de investigação, que ia acompanhando de insólitos comentários. Oh que tristeza! Burros, ignorantes e perigosos! Sacanas! – eram palavras que me iam ocorrendo. Finda a busca esmiuçada, começaram a atirar para o chão os livros que retiravam das estantes, na sala: umas dezenas, seleccionados para apreensão. Em grande parte, com base em critérios que evidenciavam a profunda ignorância daquela gente “básica” da PIDE/DGS. Pouco tempo depois, alguns, dispersos, atapetavam a sala, outros acumulavam-se em pilhas. Enquanto a devassa decorria, os nossos filhos pareciam viver já no futuro. Ela, com um ano e meio, dormia serena sobre a agenda que continha marcações cifradas de datas de reuniões ilegais ou clandestinas. Ele, com três anos, ao passar na sala interrogava, inocente: «Mãe, estes amigos estão a ler os nossos livros?» No dia seguinte fiz 35 anos e reuni a família em casa, num jantar, a fazer de conta que a vida prosseguia igual. As crianças batiam palmas, contentes, soprando as velas do bolo de aniversário, e eu só ansiava pelo dia 25 de Abril… – Assim mesmo! Contava as horas que faltavam para chegar esse dia, porque tinha-me sido marcada a primeira visita com o meu marido para uma semana depois, exactamente nessa histórica quinta-feira da Revolução.
No dia 24 deitei-me ansiosa por que chegasse a manhã. Às 11 horas iria a Caxias, vê-lo e levar-lhe comida e roupas. Seriam 4 da madrugada quando o telefone tocou na sala e, em sobressalto, fui atender. Do outro lado, uma voz grave: – Venho informá-la de que estão em curso movimentações militares para derrubar o regime… Estamos numa revolução e uma das primeiras coisas que vamos fazer é libertar o seu marido e todos os presos políticos. «Só me faltava este!» – pensei e, sem dizer uma palavra, desliguei o telefone. Provocadores! – resmunguei, enquanto regressava à cama. Pelas 6 horas acordaram-me outra vez, mas agora era alguém que eu conhecia a dar-me a notícia. O jornalista António Santos falava e, ao fundo, ouvia-se o barulho da rotativa do jornal. E, por estranho que pareça, não posso dizer que esse tenha sido o dia mais feliz da minha vida…
Dois dias inteiros entre o pânico e a euforiaO estertor do regime iria revelar-se particularmente difícil para os presos políticos, sobretudo para aqueles, homens e mulheres, que se encontravam em Caxias e em Peniche. Começaram por desconhecer a natureza das movimentações de que se davam conta, admitindo tratar-se de um golpe da extrema-direita. Depois, a espera. Foram horas e horas de angústia, que nós, cá fora, partilhámos com eles, somente porque lha adivinhámos, minuto a minuto. No exterior do forte, as famílias iam tendo a informação de que estavam a decorrer cuidadas negociações para a libertação e conheciam o risco de os pides e os guardas prisionais, antes de se entregarem, poderem abrir fogo contra os presos. Pouco terá ficado registado, gravado, filmado, impresso, acerca do desfiar das longas e dramáticas horas vividas por quem aguardava, sobretudo na proximidade da prisão. Na memória do grupo aí presente estarão esculpidos, de certeza, pedaços tenebrosos do início da revolução. Da minha nunca se apagaram… Vi o telejornal do dia 25 em casa de um querido amigo que eu conhecera na Seara Nova e que era, então, da CDE, o Alberto Pedroso. Entre o pânico e a alegria.Hoje, passados todos estes anos, não me lembro de coisas que eu juraria, nesse dia, que iriam ficar até ao meu fim. Vividos em estados emocionais exacerbadíssimos e numa explosão de afectos, aqueles acontecimentos pareciam estar a ser inscritos a letra de ouro na minha memória. É pois surpreendente que não tenha a menor ideia do noticiário dessa noite na RTP, nem de grande parte do que fiz durante o dia. Só retalhos dispersos: uma reunião de familiares de presos políticos, em Benfica, em casa do jornalista (preso) Fernando Correia; uma ida com a Aida Magro ao Rádio Clube Português, na Sampaio Pina, a convite do General Costa Neves [então, major Costa Neves, que liderou o grupo que ocupou o Rádio Clube Português e que pediu que nos dirigíssemos aos portugueses, em representação das famílias, apelando à serenidade e confiança no MFA]. Mas, nunca esqueci o meu Pai, ao meio-dia, no passeio em frente da nossa casa do Bairro da Encarnação, vestido de uma maneira impensável – nem na noite do forte sismo de 69! Fui lá, de manhã cedo, deixar os meus filhos e ele, na rua, em pijama e com um ar calmo, cansado de décadas sem liberdade – referindo-se à PIDE, ao governo e aos fascistas – clamava alto para os vizinhos e a quem passava: «Eles têm que ser julgados num tribunal plenário. Não pode haver perdão para o que fizeram!» Talvez sejam estas as imagens do dia 25 de Abril que retenho com maior precisão. A felicidade só me chegou na madrugada do dia 27.

A NOITE MAIS LONGA

Um pouco antes do nascer do sol, fomos para cima e quedámo-nos expectantes, em silêncio, numa barreira ao lado do Forte de Caxias. Mais tarde, já com a luz do alvorecer, vimos os pides sair da Cadeia em carrinhas – a fugirem, ali na nossa frente, a uns dois metros.(E nós, a atirarmos-lhes todas as pedras que pudemos, roucos de lhes gritar que seriam julgados pelos crimes que haviam cometido – oh inocência!). É por esta altura que são gravadas pela RTP as primeiras imagens de Caxias. Assistimos à chegada dos fuzileiros que, em poucos minutos, tomaram conta da prisão. Vimos alguns deles perfilarem-se como estátuas por cima do grande muro que a cerca. Foi então que apareceu o pai do Eugénio Ruivo (preso) com uma carrinha aberta, cheia de cravos que distribuiu pelos fuzileiros e por todos nós. Estou a vê-lo: chegou contente, como se aquela festa fosse a sua. E era, também sua. Não houve baioneta que ficasse sem cravo encarnado. Os nossos continuavam lá dentro mas, cá fora, respirámos fundo. Lembro-me que tremia de frio (e nervoso) e, por isso, apareço nas imagens da RTP, na barreira, com um cachecol à volta da cabeça e um cravo na mão. Soube-se então que, perante a hipótese de irem sendo libertados a conta-gotas, e de acordo com um critério supostamente negociado, os presos responderam: «Só saímos todos de uma vez, ao mesmo tempo!» Assim aconteceu. A multidão tinha tomado conta do parque em frente ao Forte. Vinham às centenas, estavam aos milhares a aguardar a saída dos presos políticos, que foram libertados só na madrugada do dia 27. Assisti de longe. Exausta. Ainda tentei aproximar-me do José Tengarrinha mas não consegui. Nem sequer acenar-lhe. Percebi que nesse momento não me pertencia: havia advogados, amigos e um mundo de jornalistas que o entrevistavam. Vi-o entrar para um carro, que avançou a custo por entre milhares de pessoas, que o saudavam com a alegria própria das horas de libertação. Entretanto, ali parada, junto aos meus, com os nossos corações a bater a compasso, aclamávamos os companheiros que iam sendo libertados.Houve um jornalista que correu a dar-me o recado: «O Zé disse que vai ter a casa após as reuniões com o MFA e com a CDE».Encontrámo-nos em casa, não tenho ideia de quanto tempo depois, mas quando agora olho uma fotografia em que o abraçam, sei que não sou eu.Para mim, estavam a começar os belos e difíceis dias da Revolução.

(A noite Mais Longa de Todas as Noites. Helena Pato, Ed. Colibri)

A NOITE MAIS LONGA DE TODAS AS NOITES
(Helena Pato, ‘Fascismo Nunca Mais’)

Uma admirável, comovente, empolgante descrição / memória / reconstrução do Final do Estado Novo. Do antes e do depois.
1962, 1969, 1974
O medo. As rusgas. As torturas. A Rua António Maria Cardoso. O sufoco de viver num país atrasado, “amordaçado” (M. Soares), em que as paredes tinham ouvidos, muita gente baixava a cabeça e fazia de conta ou aproveitava o sistema sinistro que nos governava – eu lembro-me bem, eu vivi esse tempo.
Em que as Mulheres eram triplamente penalizadas pela Ditadura política, legal e de costumes.
As Mulheres operárias, mais ainda.
Com ajuda da Polícia, da Igreja Católica e de todos os Bufos.

Será hoje será esta manhã que a PIDE me vem buscar?
E que farei com os papeis que aqui tenho?
E com as minhas crianças / Família?

Pedro Ramos de Almeida e a sua coragem e militância (Nuno Ramos de Almeida, João Ramos de Almeida). Teresa Dias Coelho, a que mataram o Pai. O escultor José Dias Coelho, que saiu à rua e foi morto a tiro.
O meu Colega António Ribeiro Santos. Morto a tiro pela PIDE numa reunião no ISEG (As Económicas»).
O meus Colegas e Amigos que morreram na Guerra Colonial.
Catarina Eufémia, morta pela GNR quando pedia um horário de trabalho decente… e «Pão para os seus filhos».

«QUEM VIU MORRER CATARINA NÃO PERDOA A QUEM MATOU.»
(José Afonso)

A angústia e a dúvida das primeiras notícias da madrugada de dia 25 de Abril de 1974.
A certeza de que o coração dos Capitães de Abril batia do lado certo.
A coragem comovente e serena de Salgueiro Maia.
O tiroteio que não houve, a Armada e os outros que se recusaram a obedecer e a matar os seus compatriotas e Companheiros de Armas.
Os PIDEs que mataram a tiro quatro jovens, na sua rua de má fama e má memória.

A capitulação no Quartel do Carmo.

O renascer da Esperança, a Libertação dos Presos Políticos, o Dia claro, «O dia inicial inteiro e limpo/ Onde emergimos da noite e do silêncio/…» de que admiravelmente fala Sophia. Como só ela sabia, saberia dizer.

O espanto dos estrangeiros que vinham ver a Revolução… (Vladimir Pozner)

[Como Angela Davis: «If they come in the Morning…»
Como Albie Sachs: «The Jail Diary of Albie Sachs»; «The Soft Vengeance of a Freedom Fighter»…]

PARABÉNS, Helena Pato. OBRIGADA.
Pelo magnífico Livro e pelo Blog que incansavelmente mantém activo: FASCISMO NUNCA MAIS.

Os jovens e os menos jovens neste País deveriam ser obrigados a ler e copiar vinte vezes este livro.
À MÃO.

(Teresa Pizarro Beleza)

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HELENA PATO nasceu em Mamarrosa (Aveiro), em 1939. Militou activamente na Resistência, durante as duas décadas que antecederam a Revolução, tendo sido presa e detida várias vezes pela polícia política. Acompanhou o marido no exílio até ao seu falecimento, em 1965. Em 1967 esteve presa seis meses na Cadeia de Caxias, sempre em regime de isolamento. Dirigente estudantil (1958 a 1962); dirigente política da CDE (1969 a 1970); fundadora do MDM (1969) e sua dirigente (1969 a 1971). Integrou o núcleo de professores que, durante o fascismo, dirigiu o movimento associativo docente (1971 a 1974). Fundadora dos sindicatos de professores (1974), foi dirigente do SPGL nos seus primeiros anos. Licenciada em Matemática, a sua vida profissional foi dedicada ao ensino de crianças e de jovens e à formação docente: leccionou durante 36 anos no ensino público e publicou livros e estudos, no âmbito da Pedagogia e da Didáctica da Matemática. Coordenou Suplementos de Ciência e de Educação em jornais diários. Dirigente do Movimento Cívico Não Apaguem a Memória (NAM), desde 2008; presidente do NAM de 2012 a 2014. Em 2013 criou no facebook e coordena, desde então, a página Antifascistas da Resistência e o grupo Fascismo Nunca Mais. Publicou dois livros de memórias do fascismo: Saudação, Flausinas, Moedas e Simones (2005, Editora Campo das Letras) e Já uma Estrela se Levanta (2011, Editora Tágide).


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