NATAL DIFERENTE
Escrito por Jorge Gaspar em Dezembro 26, 2020
Jantar de Natal. Poucos e rápido.
Diferente de todos.
Porque temos de estar afastados—e vá lá que a casa é grande,
comporta duas mesas grandes…para seis.
E porque temos de usar máscara sempre que não se esteja a
comer ou a beber.
Tenta-se conversar, mas as máscaras parece que levam a nossa
voz e temos de berrar.
Então os cães assustam-se e desatam a ladrar. E a Taliska põe-se
de pé, e é da minha altura quando estou sentada. Quer dar-me
beijinhos e não percebe que não se pode. Nem mesmo aos cães.
Começo a falar de vizinhos antigos, que lá moravam no prédio,
mas já morreu toda a gente, agora são outros e, como é habitual,
ninguém se conhece.
Esta é uma casa onde nunca me sinto bem : a minha mãe e o
meu pai moraram aqui, as recordações não são famosas…
No Natal do ano passado , à saída eu ia a descer a escada e caí. E
logo uma amiga minha, que é meio bruxa, me disse “caíste?,
Não, tu não caíste, tu foste empurrada!”
E a verdade é que me sinto sempre mal em casa onde eles
tenham vivido.
Os meus netos lá vão dando cd’s uns aos outros. Não conheço
nada daqueles grupos, daqueles intérpretes. Mas os miúdos,
mesmo pequenos, sabem tudo.
Lembro-me que quando às vezes nos meus livros, preciso de
falar de um músico ou de uma música que os miúdos conheçam
agora, tenho sempre de pedir ajuda à minha neta.
Já todos comeram, já todos se presentearam, são horas de voltar
para casa.
Quando espero ver o meu filho levantar-se para me ir
levar—não, o meu neto já está de casaco vestido e diz “anda avó,
que eu levo-te no carro”
Por momentos vou a dizer “tu?”, mas páro a tempo.
Nunca me lembro que ele cresceu. E que já tem carta.
Isso também torna o Natal diferente.