EDUARDO LOURENÇO MULTIPREMIADO PENSADOR PORTUGUÊS 23 MAIO 1923
Escrito por Jorge Gaspar em Maio 23, 2020
Eduardo Lourenço (São Pedro de Rio Seco, Almeida, 23 de Maio de 1923), pensador, professor e ensaísta português.
A 23 de maio, homenageia-se o ensaísta português Eduardo Lourenço, multipremiado pensador, que nasceu neste dia. É um dos mais relevantes nomes da sociedade contemporânea, um poço sem fundo de inquietante conhecimento.
Nasceu numa pequena aldeia da Beira Interior e tornou-se senhor do mundo, marcando o pensamento ao longo de mais de 50 anos, sobretudo no pós-25 de abril.
Assinala-se hoje mais um aniversário de Eduardo Lourenço, pelo que é dia de recordar um cidadão que derrubou fronteiras.
Começou a distinguir-se em Coimbra, aquando da sua licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas, concluída em 1946. Na cidade do conhecimento, encontra um ambiente aberto a reflexão.
Prossegue a sua formação académica com um estágio na Universidade de Bordéus, em 1949, e torna-se embaixador da cultura portuguesa nas universidades de Hamburgo e Heidelberg (entre 1953 e 1955) e na Universidade de Montpellier (de 1956 a 1958).
É docente durante um ano na Universidade Federal da Bahia, como professor convidado de Filosofia, e passa a viver em França, em 1960.
Fixou residência em Vence, cinco anos mais tarde, e foi reitor na Universidade de Grenoble, de 1960 a 1965. Tornou-se professor jubilado em Nice, em 1988, um ano antes se tornar conselheiro cultural junto da Embaixada Portuguesa em Roma, até 1991. Em 1999, passa a ocupar o cargo de administrador não executivo da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
Influenciado por nomes como Husserl, Kierkegaard, Nietzsche, Heidegger, Sartre, Dostoievski, Franz Kafka ou Albert Camus, Eduardo Lourenço desenvolveu pensamentos sobre o existencialismo, sem nunca se deixar levar por correntes teóricas e ideologias.
Ao longo da sua vida, que perdura, Eduardo Lourenço publicou livros, ensaios e pensamentos. Crítico e ensaísta literário, virado predominantemente para a poesia, colecionou prémios, dos quais se destacam o bem recente Prémio Pessoa (em 2011), a Ordem de Santiago da Espada (1981) o Prémio Europeu de Ensaio Charles Veillon, Prémio Camões (1996), Cavaleiro da Legião de Honra de França (2002), Prémio Vergílio Ferreira (2001), Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura (2008), além de diversos doutoramentos honoris causa.
“Pensar, pensamos todos. Não só os humanos mas, segundo os antropólogos, todos os seres viventes. Pensar é ser um eco do que o Cosmos tem para nos dizer. É saber o que somos como tempo passado, como História; termos uma imagem mais ou menos objectiva do nosso percurso — o que é absolutamente inviável, mas uma pretensão como outra qualquer. Pensar é um diálogo que temos connosco próprios. E é sempre qualquer coisa que acontece em função de um espectador possível, mesmo que não tenhamos pensado ou escrito com o propósito de ter uma escuta, como acontece com estas notas [o livro “Da Pintura”, ed. Gradiva, 2017].”
Eduardo Lourenço (São Pedro de Rio Seco, Almeida, 23 de Maio de 1923), pensador, professor e ensaísta português.
.
“S. Pedro do Rio Seco é uma aldeia, do distrito da Guarda, entre outras aldeias que estão ali ao lado uma das outras, a cinco quilómetros. Não há praticamente comunicação entre elas, porque realmente não têm nada que trocar entre si. Naquele tempo eram economias de pura subsistência. A troca fazia-se apenas em dois sentidos: um para Vilar Formoso, que era a saída para o Mundo, era o caminho-de-ferro que trazia a Europa até ali.
[…] E depois, havia Almeida que era a sede administrativa do concelho, que ficava a nove quilómetros, mas onde só se ia também para a feira todos os meses, ou para a festa anual. Também se ia lá por ser sede administrativa: o registo civil, o tribunal e o médico.
[…] E foi nesse mundo que eu vivi uma infância relativamente protegida e aberta também. Aquilo era o último estádio da civilização que já era uma civilização capitalista na sua franja mais rudimentar. Praticamente quase só se vivia do que se produzia na aldeia e não havia trocas. Apenas uma pequena troca que permit[ia] às pessoas comprarem qualquer coisa, vestirem-se, calçarem-se, etc. Muitos daqueles lavradores desse tempo não mandavam os filhos à escola porque não estava na perspectiva deles. Também não teriam dinheiro. Ninguém pensava mandá-los para a Guarda para fazer o Liceu, o quinto ano, e muito menos para a Universidade.
[…] Era um mundo muito arcaico que eu chamo Piccolo Mondo Antico, título de uma novela célebre de Antonio Fogazzaro, que é um título que eu acho admirável. Se algum dia escrevesse memórias sobre S. Pedro, teria um título parecido. Um pequeno mundo morto, ou coisa parecida”.
(O Outro Lado da Lua. A Ibéria segundo Eduardo Lourenço, edição e entrevista de Maria Manuel Baptista, 2005 Porto, Campo das Letras.)