NA MORTE DE CARMEN DOLORES
Escrito por Jorge Gaspar em Fevereiro 20, 2021
Carmen Dolores morreu na passada 3ª feira, com 96 anos.
Lembro-me dela ainda no tempo em que fazia teatro radiofónico
e eu era miúda. Nunca me esqueço quando ela era a
Hermengarda, do “Eurico, o Presbítero”, de Alexandre
Herculano. Enlouquecia e gritava “Euriiiiiiico!… Euriiiiiico!…”. Eu
ficava apavorada, de tal maneira que corria a enfiar-me na cama,
a tremer de medo.
Nessa altura as crianças podiam entrar em todo os teatros e
cinemas, e eu fui sempre acompanhando a carreira dela, no
Trindade, no Nacional, e –então já adulta—naquela experiência
extraordinária que foi o Teatro Aberto, aos fins de semana no
palco do Cinema Império. Eu e o meu namorado íamos sempre
às sessões das 11 da manhã—e o teatro estava sempre cheio.
Nunca perdemos um epectáculo. Lembro-me do “Tinteiro”, do
“Ratos e Homens”—mas sobretudo do “Felizmente Há Luar” e
de “O Render dos Heróis”, que vimos duas vezes.
Mas a censura não deixou aquele sonho durar muito—e o grupo
teve de acabar. Apesar de tudo ainda durara quatro anos.
A Carmen foi uma actriz que sempre soube gerir bem a sua
carreira e que, muitas vezes, pôs a família antes do teatro. Por
isso acompanhou o marido a Paris, onde viveu durante sete
anos. Regressou e continuou a fazer teatro, cinema, televisão
Soube também retirar-se a tempo, no fim da representação da
peça “Copenhaga”, no Teatro Aberto, em 2005.
Lembro-me de uma entrevista que ela então deu ao António Macedo,na
Antena-1, em que a dada altura exclamou: “Ai António, o que eu
fazia se tivesse agora 80 anos!”
E temos duas coisas a unir-nos : embora em épocas diferentes,
andámos ambas no Liceu Filipa de Lencastre.
“AS MINHAS HISTÓRIAS NAS ONDAS DO ÉTER”