O MEU ESCRITÓRIO
Escrito por Jorge Gaspar em Abril 17, 2021
Sou outra mulher.
As esplanadas reabriram. Espero sinceramente que o
pessoal não abuse, que é para não termos de voltar para
trás. Portanto: máscara na boca (quando não estiverem a
comer, claro…), mãozinhas desinfetadas e, no máximo,
quatro pessoas em cada mesa , e com o distanciamento
necessário.
Sou de uma geração que sempre trabalhou nos cafés.
Onde ainda havia tertúlias nos cafés (o Montecarlo, que
hoje já não existe ; o Toni dos Bifes ,que hoje é um
restaurante finório, se é que não fechou; a Paulistana,
que foi deitada abaixo há anos).
Lembro-me de ouvir o escritor Augusto Abelaira dizer “se
um dia os cafés fecharem, eu deixo de escrever”
E já Mário de Sá Carneiro escrevia :
“Minha mesa de café…/ quero-lhe tanto… A garrida/toda
de pedra brunida/ que linda e que fresca é… “
Depois os donos dos cafés começaram a pôr nas paredes
avisos como este : “é proibido estudar nestas mesas.”
Ou, como ainda há pouco vi : “não é permitido ocupar a
mesa por mais de meia hora”.
Agora, felizmente, as esplanadas não põem limites ao
tempo da nossa permanência. É claro que se eu vir que há
gente a querer lá estar e as mesas estão todas ocupadas,
não me vou demorar para aí uma hora!
Felizmente–para mim, não para o dono do café,
certamente– a esplanada onde costumo ir está quase
sempre vazia. Duas ou três mesas ocupadas, e por pouco
tempo, bebem um café e vão à vida. É lá que eu escrevo,
que eu leio, que eu ponho a correspondência em dia. (O
dono de uma farmácia ao lado até me costumava dizer “
então vai para o seu escritório?”)
Claro que preferia um café a sério, a uma esplanada. Mas,
apesar disso, estou muito feliz.
“AS MINHAS HISTÓRIAS NAS ONDAS DO ÉTER”